A Constituição Brasileira, promulgada em 05/10/1988, é uma lei anacrônica, esdrúxula, imprópria para uma carta-magna, remendada para atender interesses do Poder e repleta de benevolências, privilégios e direitos sem deveres, obrigações ou contrapartidas . Fomenta centralização da justiça no STF, insegurança jurídica, morosidade da justiça, estado policial , ausência de civismo, desigualdades, desarmonia nos Poderes, centralização dos impostos na União, desordem pública e insegurança social. Jorge Bengochea

domingo, 6 de maio de 2018

A CONSTITUIÇÃO LEMBRA UM CERTO POSTO DE COMBUSTÍVEL


ZERO HORA 05 de Maio de 2018


ENTREVISTA


CARLOS AYRES BRITTO
Ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal




Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres Britto afirma que a Constituição ainda é pouco entendida, apesar de estar às vésperas do 30º aniversário, o que explicaria o elevado número de emendas ao texto. Entusiasta da Carta Magna, afirma que nela estão as respostas que oferecem "janelas de oportunidades" para uma versão melhor do país. Descarta a necessidade de revisão, mas clama para o cumprimento de seus artigos.

A Constituição recebeu 105 emendas em 30 anos. Qual é a sua avaliação?

Considero o número elevado. Não havia a necessidade de tanta emenda. A Constituição é pouco estudada, por incrível que pareça. Muito pouco entendida. O que nos cabe é nos convencermos de que ela é de excelente qualidade. Nos torna um país juridicamente primeiro-mundista. A mais democrática de todas as nossas constituições, seja no seu processo de elaboração, seja no seu conteúdo. Fez da democracia o princípio dos princípios.

O número de alterações é elevado?

Não havia necessidade de mexer tão freneticamente. Mas que sirva de lição, que a gente pare nesses 30 anos para perceber que a Constituição lembra um certo posto de combustível, cujo nome não vou dizer, que tem resposta para todas as perguntas. E se queremos segurança jurídica máxima, nada melhor do que aplicar a lei máxima, que é a Constituição.

O texto é elogiado, mas também criticado por ser extenso e detalhado.

É verdade, ele foi alongado numericamente. Pelo número de seus dispositivos foi uma Constituição adiposa, robusta, que não fez regime de emagrecimento. Era chamada, à época, pejorativamente, de Constituição prolixa. Com o tempo, começamos a tirar partido dessa materialidade expandida, uma Constituição que açambarcou princípios, normas importantes de outras disciplinas jurídicas, a ponto de se dar com esses 30 anos o fenômeno da constitucionalização do Direito brasileiro. Hoje, o penalista, o civilista e o comercialista têm de ser constitucionalista.

Como poderia ser mais protegida?

A democracia que a Constituição implantou, princípio dos princípios, não vence por nocaute. Ela qualifica a vida política, jurídica, ética e social brasileira, mas encontra reação porque a nossa sociedade é tradicionalista, elitista. As relações de base, aquelas que definem o perfil de uma sociedade, aqui no Brasil são autoritárias, não são igualitárias. A sociedade brasileira é profundamente desigual a ponto de sermos um país rico, mas de povo majoritariamente pobre.

O senhor avalia que a essência da Constituição permanece inalterada?


Permanece. Apesar de tantas mudanças, a estrutura do pensamento constitucional não foi alterada. Pelo menos, os princípios fundamentais, título primeiro da Constituição. Os direitos e garantias fundamentais, título segundo, permaneceram. Foi até modificado pontualmente, mas para melhor.

É necessária alguma revisão ou uma nova Constituição a curto ou médio prazo?

Em rigor, não. Podemos escolher as prioridades que já estão nesta Constituição. Agora, mudanças pontuais, tópicas, nesse andar da carruagem, podemos fazer para aperfeiçoar os costumes políticos, por exemplo. Temos andado de costas para a Constituição e, por isso, não estamos bem. Se passarmos a andar no caminho luminoso da Constituição, o Brasil será um país não só primeiro-mundista juridicamente, como no plano dos fatos. E a prioridade das prioridades é distribuir renda, é encurtar distâncias sociais. Vamos aplicar essa Constituição a partir dos direitos sociais, que são uma viagem sem volta.


ENTREVISTA


Para especialista, novo texto, neste momento, seria arriscado



A opinião dominante entre juristas, pesquisadores e antigos constituintes é de que ainda é preciso intensificar a aplicação de dispositivos sociais. Trechos que definem direitos essenciais aos brasileiros - que levaram a Carta Magna a ser chamada de Constituição cidadã - não refletem o real acesso às prerrogativas, como educação, trabalho, alimentação, moradia, lazer e segurança.

Mesmo assim, a visão é de que não haveria ambiente para a elaboração de uma nova Constituição devido à atual situação política do país.

- Nosso último Congresso Nacional é um dos mais conservadores da história brasileira. Da forma como está hoje, é melhor manter a Constituição Federal na sua redação atual. Acho que haveria um risco sério de ela ser piorada - opina o professor do Departamento de História da PUC-SP Luiz Antônio Dias.

EM TRÊS DÉCADAS, 105 EMENDAS À CONSTITUIÇÃO



ZERO HORA 05 de Maio de 2018


MATEUS FERRAZ RBS BRASÍLIA


AJUSTES NA CARTA MAGNA são criticados por constituintes e pesquisadores, enquanto juristas ressaltam a necessidade de atualização do documento




Às vésperas de completar o 30º aniversário, a Constituição brasileira - marco entre o fim da ditadura militar e a redemocratização - acumula um recorde que divide opiniões. Desde sua promulgação, em 5 de outubro de 1988, foi modificada 105 vezes. Enquanto pesquisadores e constituintes criticam o excesso de alterações, juristas justificam as mudanças pela necessidade de atualização.

Um dos motivos apontados para o número de emendas é o nível de detalhamento da Carta Magna, promulgada com 245 disposições permanentes e 70 transitórias. Isso fez com que diversas questões específicas fossem incluídas.

- Havia uma expectativa muito grande em relação a mudanças e à busca de garantias, que os diversos segmentos entenderam que, se não fossem introduzidas na Constituição, não seriam depois - relembra o deputado constituinte e ex-vice-governador gaúcho Vicente Bogo (PSDB).

A tramitação de propostas de ajustes ao texto constitucional, as PECs, está interrompida no Congresso. A razão é o decreto do presidente Michel Temer de intervenção federal no Rio de Janeiro. Com isso, cerca de 190 PECs aptas a ir a plenário estão paradas.

Entre as últimas emendas, aprovadas em 2017, estão a do teto de gastos da União, a que libera a prática da vaquejada e a minirreforma política. Diante da média superior a três alterações a cada ano, o professor de Direito Constitucional da Fundação Getulio Vargas (FGV) Dimitri Dimouli destaca que há dispositivos do texto que ainda não são aplicados, principalmente em relação a direitos sociais, mas minimiza qualquer impacto à essência do documento aprovado em 1988. Um dos autores do estudo Resiliência Constitucional, Dimouli destaca que o texto tem alta capacidade de adaptação a questões políticas e econômicas.

Em direção oposta, o doutor em Ciência Política Antonio Lassance avalia que o processo de emendas à Constituição está "banalizado". Para ele, os candidatos à Presidência da República deveriam incluir em seus programas eleitorais as emendas que pretendem apresentar, para que sejam avaliadas pelos eleitores:

- Temos eleições a cada dois anos e as mudanças deveriam ser submetidas a referendo.

Para que uma PEC seja aprovada, são necessárias duas votações na Câmara e duas no Senado, com apoio de três quintos de cada Casa - 308 votos de deputados e 49 de senadores.

Na elaboração da Constituição, que consumiu 20 meses do Congresso - dividido entre as discussões constitucionais e os demais trabalhos legislativos -, a possibilidade de aprovação de emendas foi incluída para a correção de instrumentos que se apresentassem ineficientes com o passar do tempo.

- Aí residiu o exagero, porque emendas foram feitas para satisfazer segmentos - analisa o deputado constituinte José Maria Eymael (PSDC), responsável pela inclusão de dispositivos que garantiram diversos direitos trabalhistas, como a redução da jornada de trabalho de 48 para 44 horas semanais e a criação do aviso prévio de 30 dias.

Autor da proposta constitucional que autorizou o voto aos 16 anos, Hermes Zaneti (PSB) diz que a Constituição vem sendo "maltratada" devido à corrupção e às exigências do sistema financeiro. Para ele, a falta de regulamentação de artigos como o que estabelece a auditoria da dívida pública serve ao mercado, mas não à população. Critica ainda a retirada do limite de 12% anual na taxa de juro, incluído em 1988 em um ambiente de instabilidade econômica e inflação galopante.

Hoje deputado estadual, Ibsen Pinheiro (PMDB), também integrante da Assembleia Constituinte, comenta outro mecanismo de revisão da Constituição, mais abrangente, definido para ocorrer após cinco anos da promulgação. No entanto, avalia que o resultado desse expediente não foi o esperado.

- O ambiente era o mesmo de cinco anos antes. Devíamos ter convocado para, no mínimo, 10 anos - analisa, lembrando que apenas seis pontos foram modificados na ocasião.