A Constituição Brasileira, promulgada em 05/10/1988, é uma lei anacrônica, esdrúxula, imprópria para uma carta-magna, remendada para atender interesses do Poder e repleta de benevolências, privilégios e direitos sem deveres, obrigações ou contrapartidas . Fomenta centralização da justiça no STF, insegurança jurídica, morosidade da justiça, estado policial , ausência de civismo, desigualdades, desarmonia nos Poderes, centralização dos impostos na União, desordem pública e insegurança social. Jorge Bengochea

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

UMA RE-CONSTITUINTE INCONSTITUCIONAL

ZERO HORA 08 de janeiro de 2013 | N° 17306 ARTIGOS

Aderbal Torres de Amorim*



Mãos talentosas trouxeram a público sugestão de uma “Constituinte para 2014, soberana mas restrita”. Seu fundamento seria “continuar o repensamento do Brasil para que se corrijam os defeitos técnicos comprometedores da eficiência da máquina pública”. Ela se ocuparia, exclusivamente, dos títulos de nossa Carta Maior que tratam da Organização do Estado e da Organização dos Poderes (Ibsen Pinheiro. “Re-Constituinte, uma saída”. Zero Hora 05.01.2003, pág. 15).

Ora, não porque se trate de dileto amigo é que devo silenciar ante a estranha ideia ali veiculada: não vejo como enquadrá-la na pedra angular de um Estado democrático de direito, a Constituição Federal. É que se a exótica “re-Constituinte” viesse como Emenda Constitucional, ela não seria “soberana”. Restaria limitada pelo núcleo duro da Constituição – as conhecidas cláusulas pétreas (art. 60). De outro lado, se a ousadia se impusesse soberana, materializaria séria fratura institucional, ao contrariar as disposições tão arduamente conquistadas pelos constituintes de 1988.

Para arrimar essa desejada “revisão parcial, mas soberana” – uma contradição em termos –, nem se a compare com a chamada Assembleia Constituinte de 1988. Antes desta, não havia Estado de direito e sim um arremedo de Constituição que nem os ministros militares que a outorgaram atreveram-se a chamá-la “Constituição”. Apelidaram-na de “Emenda Constitucional nº 1”, como se no Estado de direito militares pudessem emendar a Constituição! Não foi por outra razão que, ao depois, os então chefes dos poderes não se constrangeram em convocar o Congresso Constituinte de 1987. Este promulgaria a denominada Constituição cidadã de 1988. Se até então reinava o caos jurídico imposto pelas armas – que repousava nas cinzas do Estado Republicano de 1946 –, nada mais justo, constitucional e moral do que convocar-se uma assembleia de cidadãos para elaborar-se um novo pacto federativo, desta vez democrático.

Mas hoje essas condições não mais existem. Bem ou mal, vive-se um regime democrático em que a vontade soberana do povo é atendida através de eleições livres. Nessa esteira, não há como alterar-se a Constituição (ao menos do modo sugerido pelo ilustre articulista), a não ser pela via das emendas nela mesma previstas. Prosperasse a ideia – e para ficar-se em mero exemplo –, se ocorresse conflito entre uma nova regra e outra da parte da Constituição não “re-constituída”, qual prevaleceria? Se válida a regra do “re-constituinte de 2014”, ter-se-ia emenda constitucional, se atendidos os limites a esta impostos; se válida a antiga, de nada serviria a “re-Constituição”.

*PROFESSOR DE DIREITO CONSTITUCIONAL NA ESM/AJURIS

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Será tão boa esta Constituição Federal de 1988 que já está com mais de 70 emendas e ainda continuam elaborando mais? Daqui a pouco teremos uma Constituição do tamanha de uma BARSA. A Constituição de 1988 e suas emendas só interessam a uma oligarquia que agregou privilégios e imunidades, aumentadas por emendas que contraditam o texto original. Houveram muitos avanços, mas alguns retroagiram em forma de emendas para continuar beneficiando poucos. Portanto, é urgente uma nova e enxuta Constituição elaborada sem lobby e por notáveis eleitos pelo povo para produzi-la, equilibrando direitos e deveres, submetendo o direito individual à justiça e ordem pública, criando o Sistema de Justiça Criminal e tirando os penduricalhos, os privilégios, as imunidades, a proibição do trabalho forçado para apenado, e a influência política na justiça e no sistema de justiça criminal, civil, do trabalho e eleitoral. POR UMA NOVA CONSTITUINTE, JÁ!

sábado, 5 de janeiro de 2013

RE-CONSTITUINTE, UMA SAÍDA



ZERO HORA 05 de janeiro de 2013 | N° 17303. ARTIGOS

Ibsen Pinheiro*



Primeiro me pareceu que a Constituinte tinha vindo tarde demais. Bandeira precoce dos anos 70, junto com anistia e a eleição direta, materializava-se 10 anos mais tarde. Pouco adiante, em pleno processo de elaboração, passei a achar o contrário, que a convocação tinha vindo muito cedo, antes que curássemos a ressaca democrática e deixássemos de pensar o futuro olhando para trás, espécie de espelho retrovisor que marcou quase todas as escolhas que devíamos fazer, como uma autocrítica dos 20 anos de autoritarismo.

Hoje, passados quase 25 anos do gesto histórico de Ulysses Guimarães erguendo-a como uma taça e promulgando a Constituição Cidadã, sei com absoluta convicção que a Constituinte aconteceu na hora certa, porque se tratava de muito mais do que escrever um texto, era construir o simbolismo do reencontro nacional, o fundamento moral e ético da relegitimação das instituições nacionais.

Pelo seu significado, a Constituição de 1988 tornou-se um marco na história nacional, mas, como texto, ficou longe do ideal, de um ponto de vista técnico ou formal. Extensa e negociada, não se situa entre as sintéticas ou as analíticas, mas ficou com o defeito principal de ambas as escolas: imprecisa pela generalidade dos acordos possíveis num ambiente de profundo corporativismo e detalhista à exaustão pela submissão às reivindicações setoriais amparadas por eficiente poder de pressão.

Para agravar, a revisão constitucional, boa ideia para corrigir os excessos ou deficiências, acabou comprometida pela proximidade de escassos três anos, quando deveríamos ter concedido pelo menos 10 anos à refundada democracia, para que pudesse repensar-se, em vez de só corroborar-se. Resultado: os avanços foram imensos no que engendraram a legitimidade e seu fundamento moral, mas foram escassos, para não dizer nulos, no aprimoramento do funcionamento das instituições públicas, especialmente da máquina administrativa, limitada a reproduzir o modelo da redemocratização implantado em 1946, também marcado pelo sentimento autocrítico do Estado Novo.

Os resultados estão visíveis. Na administração, com exceção do novo Ministério Público, tudo o mais é velho, recauchutado ou piorado, notadamente no funcionamento das três sedes dos poderes, Legislativo, Judiciá- rio e Executivo, especialmente os dois primeiros, pois o terceiro pega no tranco, goste ou não. Os outros dois disputam entre si um insólito protagonismo de segunda, produzindo, pela ordem, a judicialização da política, a politização da Justiça e a demonização de ambas, bem longe da sonhada harmonia e independência.

Chegou a hora de continuar o repensamento do Brasil, de uma forma coletiva e conjugada, como na Constituinte, com o limite da intangibilidade dos seus fundamentos morais, éticos, políticos e sociais, para que se corrijam os defeitos técnicos – ou antitécnicos – comprometedores da eficiência da máquina pública no que se refere à organização do Estado e à organização dos poderes. É o que se aplica, em vez das fracassadas reformas políticas (eu mesmo participei de pelo menos duas), uma Constituinte para 2014, soberana mas restrita a esses pontos, regulados pelos Títulos III e IV da Constituição Federal. É hora oportuna e legal, até outubro deste ano, para propor e tramitar a convocação, não se descartando o papel condutor que podem desempenhar as mais qualificadas testemunhas dos problemas de gestão do sistema de 1988, a presidenta e seu vice.

*JORNALISTA E CONSTITUINTE DE 1988

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Com certeza. A atual Constituição com suas mais de 70 emendas já se mostrou anti-cidadã e anti-democrática, pois é mal redigida e cercada de garantias, direitos e privilégios, sendo desprovida de deveres, obrigações, sistema e dispositivos próprios de uma constituição voltada ao interesse público. O destacado jurista Hely Lopes Meirelles já a definia como mal redigida, confusa, assistemática e imprópria. Ela é a origem da desarmonia, da inoperância, dos conflitos, da submissão dos poderes ao poder político e da impunidade, fomentando a desarmonia, a separação dos Poderes para com o Estado governante, as divergências na aplicação da justiça e os óbices na preservação da ordem pública que inutilizam esforços dos instrumentos de prevenção e contenção.