“PEC dos recursos aumenta insegurança jurídica” - Por Gabriela Rocha e Marina Ito, CONSLUTOR JURÍDICO, 22/04/2011
A PEC dos Recursos, que antecipa a execução da sentença logo após o julgamento do processo pela segunda instância, causa reflexo, em maior e menor grau, em várias áreas do Direito. A ConJur procurou saber quais os impactos em processos que discutem relações familiares, negócios empresariais, questões de propriedade intelectual ou litígios no âmbito eleitoral. No que se refere à segurança jurídica, a maioria dos especialistas ouvidos demonstra preocupação com a Proposta de Emenda Constitucional apresentada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Cezar Peluso.
“Em princípio, os recursos aos tribunais superiores não têm efeito suspensivo e podem ser executados provisoriamente, mas a PEC vai dar mais insegurança jurídica ainda ao cidadão”, afirma a advogada especialista em Direito de Família Gladys Maluf Chamma. Ela diz que, na maioria das vezes, os recursos não são recebidos. Os que são, diz, é porque ficou mais ou menos evidente que algum artigo de lei federal ou da Constituição foi infringido. “Para o Direito, em geral, não é bom”, entende.
Acostumado a lidar com contratos que envolvem empresas de grande porte, o advogado Luiz Antônio Lemos, do Campos Mello Advogados, explica os problemas que pode causar a execução de uma decisão, sem que o recurso para os tribunais superiores suspenda seus efeitos. Se um investimento for questionado judicialmente e o primeiro grau entender que, no local, não pode ser desenvolvido, mas a segunda instância for favorável ao investidor, a dúvida será: tocar ou não a obra?
Quando se trata de questão ambiental, os dois perdem. Se os tribunais superiores reformam a decisão, o investidor não poderá desfazer o projeto já desenvolvido e estará sujeito à indenização para ressarcir um direito que não foi reconhecido pela decisão de 2° grau. “As duas partes perdem. O investidor não vai poder levar para frente o projeto no qual já investiu e o vencedor não vai ter conseguido preservar a área como tinha interesse.” Lemos lembra, ainda, que muitas ações civis públicas e ações populares questionam investimentos em áreas de energia.
Para o advogado, a única forma de se obter prestação jurisdicional, nesse caso, é com indenização. E caberá ao tribunal superior que reformar a decisão da segunda instância prever como o então vencedor e agora vencido terá de indenizar a parte contrária. “No sentido de não suspender investimentos, a proposta é positiva”, diz. No entanto, tem dúvidas se a PEC, se aprovada, terá eficácia.
Marcelo Romanelli de Oliveira, também do Campos Mello, constata que as empresas terão de incluir a mudança na análise de risco da empreitada. “Lidamos com áreas em que os investimentos são muitos altos, não é algo que se pode voltar atrás”, diz.
Ele observa que, atualmente, as empresas já avaliam riscos das decisões do Judiciário. “Com a PEC, vão ter que decidir entre esperar a decisão do tribunal superior para concretizar o investimento ou correr risco de perder o negócio.” Para Romanelli, há casos em que, de fato, os recursos são protelatórios; outros, não.
Já a especialista em recuperação de empresas, Juliana Bumachar, do escritório Bumachar Advogados Associados, afirma que não haverá grande impacto com a PEC em processo que tenta reerguer organizações em dificuldades financeiras. Como o processo visa a recuperação da empresa, conciliando interesses com os credores, todos querem que dê certo.
A PEC pode causar impacto em processos que Juliana Bumachar chama de “satélites”, como o do banco que entra com uma execução e pede a penhora de um bem essencial que, se penhorado, pode inviabilizar a recuperação da empresa. Nesses casos, a redução de recursos surte efeito. “No processo falimentar em si, os recursos já são reduzidos na medida em que não há réu”, diz. Juliana também considera importante que as questões sejam levadas a tribunais superiores para que os ministros discutam questões importantes e haja precedentes.
Especialista em propriedade intelectual, Luiz Henrique Amaral, avalia a PEC de um modo diferente de seus colegas. “Na área de propriedade intelectual, vemos com bons olhos melhorias que visam dar eficácia às decisões”, diz Amaral. Presidente da Associação Brasileira da Propriedade Intelectual, Luiz Henrique Amaral afirma que a PEC resolverá um grave problema em todas as áreas, inclusive a de PI, que é o excesso de recurso, que o advogado vê como um incentivo à ineficácia.
Para Amaral, a PEC vai prejudicar, por exemplo, o infrator que usa indevidamente uma marca. No processo judicial, diz, o perdedor quer deixar a execução para mais tarde. Amaral lembra que o processo é submetido a uma longa discussão na primeira instância, passando por uma rediscussão na segunda. “Quando há um recurso especial ou extraordinário, já se saiu da briga das partes”, constata. Favorável ou desfavorável, entende Amaral, o importante é haver um resultado e a decisão ter efetividade.
Luiz Henrique Amaral diz que a PEC dos Recursos é uma proposta cirúrgica e pontual, que não complica a área processual.
Eleições
O advogado Ruy Samuel Espíndola, especialista em Direito Eleitoral, afirma que a PEC dos recursos não vai alterar o Recurso Especial Eleitoral. “Isso por que o Recurso Especial Eleitoral é contemplado, sem esse nome jurídico expresso, em outra dimensão do texto constitucional. E recebe o nome de Recurso Especial, apenas pelo Código Eleitoral”, explica. O advogado também afirma que o Código Eleitoral estabelece que os recursos para o Tribunal Superior Eleitoral não tem efeito suspensivo.
“A jurisprudência eleitoral afirma pacificamente que as decisões condenatórias, no que toca a matéria de captação ilícita de sufrágio nos procedimentos não criminais, condutas vedadas, ou seja, nas representações eleitorais, ação de investigação judicial eleitoral e ação de impugnação de mandato eletivo, tem efeito imediato.” Ou seja, cassação de registro, diploma ou mandato, em regra, são executadas imediatamente. “Muitas vezes, um avassalador e triste efeito imediato”, constata.
Espíndola afirma, ainda, que a Lei complementar 135/10, a chamada Lei da Ficha Limpa, sedimentou a tendência de execução imediata das decisões condenatórias em matéria eleitoral não criminal, reformando as normas pertinentes aos debates processuais sobre inelegibilidade. “Atualmente, cabe sempre a parte recorrente condenada em matéria não criminal, se quiser obstar os efeitos da decisão condenatória, interpor medida cautelar para tal fim”, diz.
Para o especialista, no que se refere à matéria não criminal no âmbito da Justiça Eleitoral, a presteza da jurisdição continuará a mesma quanto aos recursais endereçados ao TSE.
Pessoa envolvida
Quando o processo envolve família, não há consenso entre os especialistas sobre os impactos que a PEC dos recursos pode causar. Embora considere nobre a finalidade da proposta de evitar o uso protelatório dos recursos, a advogada Maria Berenice Dias afirma que também há um risco enorme na restrição. “Há casos em que é indispensável o efeito suspensivo. No Direito de Família, as situações mais vulneráveis que podem ser afetadas negativamente pela PEC são as vidas de crianças sobre as quais é discutida a guarda, direito de visita ou autorização de viagem”, diz.
A especialista diz que não se pode abrir mão da manifestação liminar dos Tribunais Superiores nesses casos, já que, com freqüência, eles alteram decisões das outras instâncias. “Ainda que a PEC seja aprovada, duvido que os ministros não vão fazer uso da excepcionalidade de agregar efeito suspensivo em determinados processos. Não se pode impedir que não haja nunca essa possibilidade”, diz. “Lidamos com pessoas e não com coisas”, completa.
Já o advogado Ricardo Zamariola afirma que , no Direito de Família, a alteração pode trazer impacto significativo nas causas que apresentam conteúdo econômico, como ações de indenização e partilha de bens. “No que diz respeito a ações de guarda e visitação não haverá impacto relevante, a meu ver. Isso porque, atualmente, as decisões de segunda instância nessas matérias já são imediatamente executáveis”, diz.
Além disso, afirma o advogado, ainda que se trate de uma execução provisória, ou seja, quando há recurso pendente, não se tem visto a exigência de garantia. “Afinal, a garantia dada pelo credor assegura o devedor contra eventual prejuízo econômico; mas, no caso das ações de guarda e visitação, não se está discutindo um direito que tenha expressão pecuniária. Não cabe falar em garantia.”
Para Zamariola, o trecho da PEC dos Recursos, que estabelece que, a nenhum título, haverá concessão de efeito suspensivo aos Recursos Especial e Extraordinário, é inconstitucional, pois fere a garantia da efetividade da tutela jurisdicional.
“O Supremo, em diversas ocasiões, já se manifestou no sentido de que o poder de cautela — exercido pelos juízes por meio das medidas de urgência, dentre as quais encontra-se a concessão de efeito suspensivo a recurso — é ínsito ao exercício da função jurisdicional.” Para o advogado, mesmo uma Emenda Constitucional não pode restringir o poder do juiz de proteger um direito que esteja sendo violado ou ameaçado de violação.
Incertezas na execução
Ricardo Zamariola tem dúvidas sobre a utilidade da PEC mesmo em casos que envolvem uma questão econômica, como ação de indenização. “Imagine que, hoje, seja proferida decisão condenando o marido a, por força de infidelidade conjugal, indenizar a esposa em R$ 100 mil. O marido recorre ao STJ e ao STF, com recursos especial e extraordinário. Em regra geral, hoje, essa decisão somente poderia ser executada de maneira provisória. Para receber o valor, a esposa teria de oferecer alguma garantia ao marido. Se ela não tiver condições de oferecer a caução, a execução provisória não prosseguirá, e a esposa não receberá, enquanto os recursos não forem julgados”, exemplifica.
Se a PEC for aprovada, no exemplo dado pelo especialista, a esposa receberia a indenização independentemente do resultado dos recursos apresentados pelo marido às Cortes Superiores. “Se, eventualmente, o marido viesse a sair vencedor, e a indenização fosse cassada, a obrigação reverteria em perdas e danos, e a esposa teria de devolver os valores”, diz.
Com um recurso pendente, diz, há incerteza. “Muitas pessoas, nessas condições, até receberão o que lhes é devido, mas terão o receio de, por exemplo, utilizar o dinheiro, até que os recursos sejam julgados”, constata. E não é só isso. No caso de uma discussão de partilha, em que a mulher obtivesse o direito à propriedade exclusiva de um bem disputado pelo marido nos tribunais superiores e pretendesse vendê-lo. Um terceiro interessado em comprar o imóvel, questiona Zamariola, iria adquiri-lo mesmo sabendo que há um recurso pendente? “O que a sociedade quer, o que a sociedade precisa, é de uma decisão definitiva no mais curto espaço de tempo possível."
"A nossa Constituição da República, do ponto de vista formal, é mal redigida, assistemática e detalhista, a redação é confusa, a matéria é distribuída sem sistema, encontrando-se o mesmo assunto em vários capítulos, e desce a detalhes impróprios do texto constitucional." (Hely Lopes Meirelles. Direito Administrativo Brasileiro. Malheiros Edit. 25 Edição.2000.pg 57)
A Constituição Brasileira, promulgada em 05/10/1988, é uma lei anacrônica, esdrúxula, imprópria para uma carta-magna, remendada para atender interesses do Poder e repleta de benevolências, privilégios e direitos sem deveres, obrigações ou contrapartidas . Fomenta centralização da justiça no STF, insegurança jurídica, morosidade da justiça, estado policial , ausência de civismo, desigualdades, desarmonia nos Poderes, centralização dos impostos na União, desordem pública e insegurança social. Jorge Bengochea
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