A Constituição Brasileira, promulgada em 05/10/1988, é uma lei anacrônica, esdrúxula, imprópria para uma carta-magna, remendada para atender interesses do Poder e repleta de benevolências, privilégios e direitos sem deveres, obrigações ou contrapartidas . Fomenta centralização da justiça no STF, insegurança jurídica, morosidade da justiça, estado policial , ausência de civismo, desigualdades, desarmonia nos Poderes, centralização dos impostos na União, desordem pública e insegurança social. Jorge Bengochea

domingo, 17 de abril de 2011

SEM REFORMAR ESSE MODELO, PAÍS NA RABEIRA DO MUNDO

Constituição - Sem reformar esse modelo, o país continuará crescendo na rabeira do mundo. Sem reformar esse modelo, o país continuará crescendo na rabeira do mundo

Declaração de abertura - Raul Velloso, 13/9/2008

A implementação da Constituição de 1988 implicou forte crescimento dos gastos público correntes, levando à derrocada dos investimentos e ao excessivo aumento da carga tributária. Na falta de investimentos públicos em certas áreas, pelas dificuldades de acesso do setor privado ou por baixa atratividade econômica, surgiram gargalos em vários setores, especialmente em transportes. Em adição, diante do excessivo crescimento da carga tributária, reduziu-se significativamente a capacidade de investimento do setor privado. Ao final, o desejável crescimento da demanda agregada da economia brasileira encontrou deficiências de suprimento de certos bens e serviços, levando a pressões inflacionárias, seguindo-se a subida das taxas de juros e a queda do crescimento econômico. Em suma, foi mais gasto público com menos crescimento econômico, somando-se a isso a sensação de que os governos gastam muito e se obtém pouco em contrapartida. A Constituição priorizou o crescimento do gasto público em assistência social e previdência, e, posteriormente, uma emenda colocou a área de saúde entre os segmentos com prioridade máxima para a destinação de recursos orçamentários.

A Carta de 1988 também aumentou a destinação automática dos recursos para os municípios, inclusive incorporando ao ICMS os antigos impostos únicos, que foram extintos. Nesses termos, aumentou-se, em muito, o grau de vinculação de receitas públicas a certos segmentos, deixando o orçamento super rígido e a área de infra-estrutura, órfã. Por último, estabeleceu o regime jurídico único para os servidores públicos, que passaram a ser apenas estatuários, incorporando nessa categoria todos os regidos anteriormente pela CLT. Nessa incorporação, foram mantidas as vantagens do regime antigo e adicionadas às dos novos.

Estima-se que somente na União quatrocentos mil servidores foram premiados com as duplas vantagens: fundos de pensão acumulados até então e, na nova situação, aposentadoria integral e estabilidade no emprego. Nessa mesma área, deu autonomia financeira aos Poderes Autônomos (Judiciário, Legislativo e Ministério Público), que aumentam fortemente o seu quinhão de gasto pessoal. Não é por outro motivo que o gasto corrente subiu tanto desde 1988 e ficou tão rígido. Na União, impulsionando essa subida, o peso dos benefícios assistenciais e subsidiados passou de 3,1% do total do gasto de 1987, para 21,8% do total do ano passado. O peso dos aposentados do regime próprio da União simplesmente dobrou. Os investimentos caíram de 16% do total para apenas 5% nesse interregno. E assim por diante. Sem reformar esse modelo, o país simplesmente continuará crescendo na rabeira do mundo.



A implementação da Constituição vem causando expansão dos gastos públicos correntes - Réplica - 19/9/2008 - 22h17

Meu oponente é contrário a uma revisão excessivamente abrangente, algo com que também me alinho. Reconhece outras características importantes da nova Carta Magna: é "casuística", "demasiadamente corporativa", "constitucionalizou matérias que deveriam ter sido deixadas para o processo político majoritário (...) desceu a muitos detalhes e protegeu o interesse de categorias em temas que não eram fundamentais". Nada a opor.

Acredita que a Constituição deve ser objeto de reformas pontuais, como no sistema previdenciário, na área tributária, política etc. Eu, idem. Não concordo, contudo, quando não reconhece que a implementação da Constituição vem constituindo um empecilho para o desenvolvimento do País. Com todos os detalhes e demais características acima condenadas, entre outros problemas, sua implementação vem causando uma forte e descontrolada expansão dos gastos públicos correntes (isto é, exclusive os investimentos), o que leva a autoridade fazendária a procurar o aumento da carga tributária a qualquer custo o tempo todo. Isso se faz por meio de um sistema tributário perverso e ineficiente, que é o único jeito de aumentar tanto assim a arrecadação. O resultado disso é que a economia não encontra espaço para investir o suficiente para aumentar a taxa de crescimento dos investimentos e do PIB (e, portanto, do emprego).

É a opção por crescer o consumo aceleradamente antes de se ter produção suficiente para tal. É preciso dosar o tamanho do suposto "resgate da dívida social", sem o que não haverá muito o que redistribuir. Mais emprego e menos redistribuição é melhor do que o contrário. Além disso, é preciso melhorar a qualidade do gasto público, para conseguir mais e melhor com a mesma quantidade de recursos que se extrai da população em geral. Afinal de contas, todos nós pagamos a conta. E, para arrecadar tanto, o nosso sistema tributário tende a extrair mais de quem tem menos. Contra-senso. Assim, as reformas do lado do gasto público são as mais urgentes.



Sob este regime constitucional, só resta ao governo cortar investimentos e aumentar a arrecadação - argumentos finais; 26/9/2008 - 20h45

Trazendo o debate para o momento atual, o Brasil foi um dos países mais beneficiados pela recente bonança que se instalou na economia mundial. A forte subida dos preços de commodities a partir de 2002, puxada pelo maior crescimento do PIB mundial (e particularmente o da China), aumentou correspondentemente o valor de nossas exportações, incrementou consideravelmente nossas reservas em moeda forte, atraiu capitais de fora, levou à queda das taxas de juros e da taxa de câmbio, produzindo, ao final, a subida dos salários reais e do crédito em geral, além dos investimentos privados e da capacidade de produção da economia.

Em adição, facilitou o combate à inflação. A ampliação do crédito e a forte onda de aquisições de negócios, em conjunto com o maior crescimento da economia, levaram a um crescimento recorde da arrecadação, que tem permitido melhorar a solvência do setor público brasileiro sem que o governo precisasse fazer qualquer esforço de ajuste do gasto. É lamentável que a falta de controle da gastança pública tenha levado, mais recentemente, ao reaparecimento de déficits cada vez mais elevados nas contas externas (o que tem maiores aportes de poupança externa como contrapartida) e a novas pressões inflacionárias, o que já levou o Banco Central, na ausência de cortes de gastos públicos correntes, a subir a taxas de juros para desacelerar a economia e combater os citados problemas.

Enquanto analistas e operadores dos mercados financeiros esperavam que a crise do crédito imobiliário americano se dissipasse lentamente, ela acabou mostrando sua cara com toda a força nos últimos dias de setembro. O grito de alerta da gravidade da crise veio com a decretação da falência do banco de investimentos Lehman Brothers e a encampação, pelo governo americano, da seguradora AIG, uma das maiores do mundo.

Na raiz do problema se situam os empréstimos imobiliários de baixa qualidade ou “podres” que foram concedidos em grande escala naquele país, algo que se multiplicou pelos mercados financeiros mundiais por meio dos sofisticados instrumentos de propagação que vêm sendo criados nos últimos tempos, sem a adequada supervisão dos reguladores desses mercados. Ao final, restou um grande (e desconhecido) número de instituições carregadas de operações de crédito com baixa chance de retorno, incertezas sobre o montante desses créditos “podres”, e ameaça de quebradeira generalizada no sistema financeiro dos Estados Unidos e de outros países.

Ou seja, estamos aí com mais uma crise de grandes proporções às nossas portas, e, infelizmente, contudo, diante da forte interdependência dos países de maior peso na economia mundial, não há como escapar de sofrer seus efeitos.

A principal dúvida é sobre a reação do governo do principal país envolvido, os Estados Unidos. Será que o “pacote” de ajuda de 700 bilhões de dólares em exame no congresso americano será, em sua configuração final, capaz de debelar a crise? Em quanto tempo? De quanto cairá o crescimento da economia mundial? Como serão afetados os fluxos de capitais, especialmente para o Brasil, e saindo daqui?

Aí se situam os dois problemas que mais nos devem preocupar. O efeito desfavorável da desaceleração mundial, depois de pelo menos cinco anos de forte crescimento do PIB do mundo, sobre os preços de nossas exportações de commodities agrícolas e minerais é um deles. O outro é a diminuição do fluxo de capitais que tem contribuído fortemente para a nova fase de crescimento mais alto e inflação sob controle.

Haverá reversão de tudo de bom para o País que aconteceu nos últimos tempos, e foi listado no primeiro parágrafo? Como reagir aqui dentro?

Ante a maior escassez de divisas, dificilmente a taxa de câmbio deixará de subir, o que ajuda a corrigir o déficit externo, mas sinaliza novas pressões inflacionárias. E se o Banco Central já vinha subindo as taxas de juros, para desacelerar o forte crescimento da demanda agregada por bens e serviços, a fim de corrigir o déficit externo e conter as pressões inflacionárias anteriores, com mais razão pedirá ao governo para conter seus gastos e diminuir a concentração do ajuste apenas na política monetária.

Esse é o ponto central da discussão econômica no Brasil dos últimos tempos: é impossível crescer a taxas minimamente razoáveis, mesmo com a vantagem de participar de um mundo crescentemente integrado financeira e comercialmente, sem um mínimo de flexibilidade na gestão das variáveis sob controle das autoridades monetárias e fiscais. E no Brasil essa flexibilidade está capenga.

A introdução bem sucedida do regime de câmbio flutuante a partir de 1999, em conjunto com o de metas de inflação, foi um grande passo na direção de dotar o País de instrumentos econômicos poderosos para atingir seus objetivos maiores. Isso é verdadeiro tanto nas épocas de “vacas gordas” (quando a queda da taxa de câmbio impede que os ganhos de choques externos favoráveis se concentrem apenas no setor exportador, mas se espalhem para o resto da economia), como na de “vacas magras”, como a que se prenuncia para os próximos meses (quando a subida do câmbio permite algum ajustamento das contas externas – beneficiando exportações e penalizando importações). Por sua vez, pelo regime de metas de inflação, qualquer desvio da meta é combatido com firmeza pelo Banco Central, que, para isso, e na ausência de cortes nos gastos públicos, aumenta a taxa de juros dos títulos que administra, a taxa SELIC, para reduzir os gastos globais do setor privado e trazer a inflação de volta para o nível que faz sentido. Só que, ao fazer isso, além de penalizar diretamente o consumo privado, ocorre o pior – reduz-se o investimento privado e, com ele, a capacidade de crescimento da economia.

Sob o enorme engessamento das contas públicas que a Constituição de 1988 produziu, e a que me referi nas colocações anteriores, retirou-se do governo a possibilidade de aumentar sua taxa de poupança (ou seja, a diferença entre receitas e despesas correntes), como agora seria o caso para não prejudicar fortemente o setor privado nem estreitar o canal do crescimento da produção e do emprego. Além disso, deixou completamente órfãos setores, como o de transportes, cuja expansão depende única e exclusivamente da destinação de recursos públicos ao item “investimentos”.

No Brasil, o comportamento dos gastos federais vem obedecendo a um padrão de comportamento que é mais do que pró-cíclico, ou seja, os gastos tendem a crescer em média acima do PIB, algo que se acentua à medida que se aproximam os finais de mandato. Como o Salário Mínimo (SM) tem peso elevado na formação dos gastos (está ligado a parcela ao redor de 23% do total) e a regra de correção monetária do SM o liga ao crescimento do PIB com uma defasagem de dois anos, nas fases de queda da taxa de crescimento deste o crescimento do SM (e, portanto, do gasto total) custa a desacelerar, principalmente se se estiver em fases de final de mandato (quando a despesa de pessoal sobe mais).

Registre-se que 37% do gasto com os benefícios previdenciários correspondem a pagamentos de 1 SM, que, por regra submetida ao Congresso, deveria crescer pela variação do INPC mais o crescimento real do PIB de 2 anos antes. Para 2009 essa conta deveria produzir um reajuste do SM ao redor de 9%. Só que na proposta orçamentária para 2009 foi indicada a taxa de 12%. Haja aumento de gasto. Os demais benefícios acompanham aproximadamente o crescimento do INPC. Como há o chamado “crescimento vegetativo” da despesa do INSS (média de 5,3% ao ano em 1998-2007), que se adiciona ao componente relativo à variação do valor médio dos benefícios unitários, é preciso que o crescimento real do PIB fique bem acima de 5% ao ano, para o crescimento do gasto do INSS se situar mais próximo – e até abaixo -- do crescimento do PIB. (O “crescimento vegetativo” se refere principalmente ao relativo ao número de beneficiários, conforme as regras em vigor).

A despesa de pessoal tende a crescer abaixo do PIB nos primeiros anos de mandato (considerado o mandato estendido de 8 anos que tem prevalecido desde 1994) e acima dele nos anos finais.

Os benefícios assistenciais e o seguro-desemprego pagam em média 1 SM e 1,5 SM, respectivamente, a cada beneficiário, e têm peso de 27% no total. Adicione-se a isso o análogo “crescimento vegetativo”, para se chegar a taxas de crescimento desse item acima do crescimento do PIB. Como ultimamente há muita ênfase na concessão desses dois benefícios, suas taxas de crescimento têm representado o dobro das taxas do PIB.

Até aqui, cerca de 75% do gasto. Dos restantes 25%, parcela de 27% corresponde aos gastos em saúde, pela Constituição indexados ao PIB nominal desde 2000. Mais indexação ao PIB. No mais, 18% dos restantes 25% correspondem aos investimentos, em franca recuperação depois de chegar ao mínimo da série em 2003. Único item que deveria crescer acima do PIB. O saldo final contém gastos obrigatórios indexados à receita (como o item “outros custeios” dos Poderes Autônomos), ficando parcela relativamente inexpressiva para o ajuste final.

Cabe acentuar que o crescimento dos gastos não-financeiros totais do governo tem estado positivamente correlacionado com o crescimento da despesa com benefícios previdenciários (que responde por 40% do gasto total).

Observação: os anos de 1999 e 2003 são atípicos por terem sido início de mandato e anos de crise macroeconômica.

Para 2008 e 2009, estimo que os benefícios vão crescer 11,9% e 13,6%, enquanto a receita líquida da União, depois de crescer à taxa recorde de 15,3% em 2008, crescerá apenas 9,2% em 2009, se o PIB real crescer apenas 2% no ano que vem, um “senhor” problema. Registre-se que a despesa de pessoal, segundo item de peso na pauta, deverá crescer 16,5% no ano que vem, depois de fechar 2008 com a elevada taxa de 14,6%, devido aos aumentos já contratados.

Mais precisamente, se, diante da crise que se agrava, o PIB crescer apenas 2% o ano que vem, o governo perderá cerca de R$ 20 bilhões da receita que ele estimou na proposta orçamentária, metade do valor atribuído a investimento nessa proposta. Mais uma vez o ônus tenderá a recair sobre os itens mais flexíveis, especialmente os investimentos, desde sempre quem paga a conta.

O fato é que, sob um regime constitucional que leva ao aumento permanente do gasto público corrente, só resta ao governo cortar investimentos e aumentar a arrecadação a qualquer custo. O sucesso obtido com a obtenção de valores recordes para a arrecadação ajudou a melhorar as condições de solvência do setor público, mas eventuais aumentos da taxa de poupança pública induzidos pelo aumento da carga tributária são mais do que compensados por redução da poupança privada, que obviamente se estreita quando os impostos aumentam. Na hora em que, como agora, a poupança externa escasseia, só resta reduzir o investimento e as oportunidades de crescimento do PIB e do emprego. Lamentável.

Raul Velloso, de 62 anos, é formado em Economia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj). PhD em Economia pela Universidade de Yale (USA), foi secretário para assuntos econômicos do Ministério do Planejamento no governo de José Sarney. Atua hoje como consultor econômico em Brasília. Debate Revista Época - É necessária uma revisão ampla na Constituição de 1988 para que o Brasil possa continuar se desenvolvendo?

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